Sessão solene destaca importância do educador Paulo Freire na Câmara dos Deputados

Nesta segunda-feira, 27, foi realizada Sessão Solene na Câmara dos Deputados em homenagem aos 90 anos do nascimento de Paulo Freire, falecido em 1997. Um dos educadores mais influentes do Século XX, Paulo Freire desenvolveu a partir dos anos 50 uma metodologia de alfabetização reconhecida em vários países.

O deputado Roberto de Lucena discursou em homenagem ao ícone da educação brasileira.

Confira na íntegra o pronunciamento.

 

 

“Senhor Presidente, Senhoras e Sehores Deputados,

 

Esta Câmara dos Deputados, no dia de ontem,  realizou uma Sessão Solene  em comemoração aos 90 anos do nascimento de Paulo Freire o mais importante educador brasileiro de todos os tempos e uma das mais notáveis referências da pedagogia mundial.  A homenagem foi proposta pelo Nobre Deputado Fernando Ferro a quem  cumprimento pela brilhante iniciativa.

 

Neste sentido, não poderia deixar a vir esta Tribuna para também render minhas homenagens ao grande educador que tanto  nos inspira.

 

Falecido em 1997, Paulo Freire deixou um legado de insuperável relevância, teorizando e experimentando sobre o binômio educação e cidadania e, por extensão, educação e democracia. É esse legado que pretendemos revisitar, preconizando sua aplicação na educação brasileira contemporânea.

 

Foi em 1961 que Paulo Freire deu início ao desenvolvimento daquele que seria um dia conhecido como o Método Paulo Freire.

 

Desde sempre sensibilizado pela desigualdade social, e sobretudo pela pobreza e alienação que encontrava entre  conterrâneos pernambucanos àquela época, Freire elaborou um método de alfabetização de adultos que primava pela contextualização do interesse dos alunos. Passando ao largo da educação tradicional, que se baseava no uso indiscriminado de cartilhas escolares, Freire concentrou o aprendizado do vocabulário no universo de interesse dos alunos, no caso inicial, lavradores de Angicos, no Rio Grande do Norte. As primeiras letras, as primeiras sílabas, as primeiras palavras eram ensinadas a partir da realidade circundante, com abolição da figura do professor autoritário e detentor do saber. Mediante um diálogo constante, e absoluto respeito pela diferença e experiência do outro, o processo de alfabetização mobilizava os alunos para a reflexão e a crítica, buscando as portas da autonomia individual e da participação política, rumo à construção de uma sociedade mais justa e mais democrática.

 

A experiência de Angicos, absolutamente revolucionária, resultou na alfabetização de 300 adultos cortadores de cana em apenas 45 dias. Voltado para as chamadas reformas de base, o governo do então presidente João Goulart decidiu aproveitar e multiplicar a experiência; elaborou-se o Plano Nacional de Educação, que previa a formação de educadores em massa e a instalação de alguns milhares de núcleos de aprendizagem em todo o País. Lembremos que, no início da década de 60, o analfabetismo era um dos mais graves problemas do País, alcançando cerca de 40% da população.

Todos  conhecemos o que se segue. O golpe militar de 64 depôs João Goulart, cassou mandatos políticos e direitos civis, e obrigou ao exílio todos os que de alguma forma eram considerados subversivos ou comunistas. Paulo Freire foi para o Chile, depois para os Estados Unidos, Inglaterra e Suíça, produzindo incessantemente e divulgando seu pensamento ao redor do mundo. Voltou ao Brasil um ano depois da anistia e ocupou o cargo de Secretário de Educação da cidade de São Paulo, no governo de Luiza Erundina.

 

Paulo Freire faleceu aos 76 anos, deixando uma obra extensa e para sempre instigante. Jamais o processo educacional, sobretudo em fase de alfabetização, foi tão perfeitamente coincidente a um propósito maior, no sentido da conscientização política do indivíduo. Como ele mesmo afirmou, “conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos; e é como sujeito, e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer”. Vinculou, assim, o conhecimento à constituição do sujeito, produzindo um pensamento pedagógico não apenas para o fim do analfabetismo, mas para o fim da alienação individual e política de todo cidadão.

 

Não por outra razão, o principal livro de Paulo Freire intitula-se “Pedagogia do Oprimido”. Nele, desenvolvem-se os conceitos norteadores de sua obra, aí incluída a urgência de se despertar a curiosidade, o espírito investigador, a criatividade de todos os educandos – ao contrário dos métodos de educação tradicionais, que se limitam à transmissão passiva de conhecimentos estanques, o professor como autoridade detentora exclusiva de um suposto saber.

 

Inspirada, pois, no ideal da emancipação coletiva, em um país marcado por brutais diferenças sociais, Paulo Freire logrou apontar um caminho inovador e revolucionário, durante o qual o aluno se vê como parte da produção de conhecimento, e não como mero depositário de um conhecimento pronto. A criação do método das palavras geradoras, concernentes à realidade imediata dos educandos, buscou, portanto, a valorização do universo e da cultura do aluno como ponto de partida para esse aprendizado verdadeiro, em que a troca, dentro de um espaço de educação eminentemente coletivo, tem primazia sobre a mera doação hierarquizada de conteúdos.

 

Senhor Presidente, por todas essas razões, estou convicto da pertinência universal dos conceitos pedagógicos formulados por Paulo Freire, e alimento o sonho de vê-los fundamentar, definitivamente, a educação no Brasil. Quando tanto nos ressentimos da baixa qualidade do ensino, quando tanto nos assustamos com o contingente de analfabetos funcionais, quando tanto necessitamos de formar verdadeiramente novas gerações de profissionais e cidadãos, não podemos deixar de recorrer ao legado de nosso ilustre maior, revisitando-o e atualizando-o para plena eficiência nos diversos níveis de educação.

 

E não estaremos sozinhos, Senhor Presidente. A relevância da obra de Paulo Freire é testemunhada pela adoção de seus métodos de alfabetização em diversos países do mundo.

 

Aproveitamos o ensejo para parabenizar o Instituto Paulo Freire, que tem realizado um belo e consistente trabalho de divulgação e atualização de sua obra, com importante repercussão nacional e internacional.

 

Finalmente, como um representante do povo de São Paulo, não poderia deixar de render minhas homenagens à memória de Paulo Freire, cujas lições de cidadania e democracia, situadas em um patamar jamais alcançado por um pedagogo em nosso País, asseguraram seu lugar entre os grandes pensadores brasileiros de todos os tempos. Cabe a nós não desperdiçá-las, hoje e sempre.

 

 

Muito obrigado.

 

Era o que tinha a dizer, Senhor Presidente.

 

Que Deus abençõe o Brasil!

 

Deputado Roberto de Lucena”

 

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