Auditores da Receita afirmam que se tabela for corrigida de acordo com inflação, mais de 10 milhões de brasileiros deixam de pagar IR
Nesta semana, o Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) divulgou um estudo sobre a necessidade de atualização da tabela do Imposto de Renda em relação à inflação. Os auditores afirmam que a defasagem chegou a 103%, superando a marca dos 100% pela primeira vez, após alta de 4,31%, no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2019.
Entre 1996 e 2019, a variação do IPCA somou 327,37%, muito superior aos reajustes realizados pelo governo nas faixas de cobrança do tributo, que ficaram em 109,63%, o que gerou defasagem de 103,87% nos valores da tabela. O ano inicial do estudo é 1996, porque foi a partir de quando a tabela começou a ter os valores em reais.
Correção ampliaria faixa de isenção
Os auditores defendem a correção da tabela do IR conforme a inflação. Se fosse corrigida, a faixa de isenção do Imposto de Renda saltaria de R$ 1.903,98 para R$ 3.881,65, e cerca de 10 milhões de contribuintes deixariam de pagar o tributo.
Kleber Cabral, presidente do sindicato, afirma: “Atualmente, cerca de dez milhões de contribuintes são isentos de Imposto de Renda. Se houvesse a correção inflacionária da tabela, o número passaria para quase 20 milhões”, disse.
Simulação de valores
Salário | Valor mensal do IR pela tabela atual | Valor mensal do IR se tabela fosse totalmente atualizada | Diferença |
R$ 4.000 | R$ 263,87 | R$ 8,88 | 2.872,8% |
R$ 5.000 | R$ 505,64 | R$ 83,88 | 502,8% |
R$ 6.000 | R$ 780,64 | R$ 180,32 | 332,92% |
R$ 7.000 | R$ 1.055,64 | R$ 330,32 | 219,58% |
R$ 8.000 | R$ 1.330,64 | R$ 506,22 | 162,86% |
Fonte: Sindifisco Nacional
A simulação realizada pelos auditores fiscais mostra que uma pessoa com renda tributável mensal de R$ 4 mil paga hoje R$ 263,87, mas recolheria apenas R$ 8,88 caso a tabela fosse totalmente corrigida. Já um trabalhador com renda mensal de R$ 10 mil paga um tributo 92,3% maior do que deveria.
Roberto de Lucena propõe atualização em PL
Para corrigir o que chama de “injustiça tributária”, o deputado federal Roberto de Lucena (PODEMOS/SP), apresentou o Projeto de Lei 3782/2019, que altera a Lei nº 11.482, de 2007 e atualiza a tabela progressiva mensal e as deduções aplicáveis à tributação do Imposto de Renda Pessoa Física.
A proposta de Lucena ganhou força após o anúncio do presidente Jair Bolsonaro, de que pretende, até o final de seu mandato, isentar do IR quem recebe até cinco salários mínimos. Exatamente a faixa de isenção defendida pelo deputado.
“No Brasil, as pessoas mais pobres pagam mais impostos. Dados publicados pela Receita Federal confirmam isso. Quanto maior a faixa de renda, maior é a parcela de rendimentos isentos, o que faz com que o topo da pirâmide pague uma alíquota efetiva menor. A faixa mais alta de renda paga, em média, 2% de Imposto de Renda, ao passo que faixas intermediárias pagam até 10,5%”, explica o parlamentar.
De acordo com o Sindifisco, a defasagem traz pessoas com salários cada vez menores para dentro da base de contribuição. O estudo afirma que, em 1996, a isenção do tributo beneficiava quem recebia até nove salários mínimos – relação que despencou para menos de dois salários em 2019.
“Temos cerca de 10 milhões de brasileiros pagando Imposto de Renda de forma indevida. Além disso, a falta de correção obriga a classe média a entregar uma fatia maior da renda aos cofres públicos. Precisamos acabar com essa injustiça urgentemente”, afirma Lucena.
Governo avalia medidas
A equipe econômica do governo estuda incluir mudanças no tributo federal dentro da reforma tributária, que está sendo discutida no Congresso Nacional. A ideia é aumentar o limite de isenção e a limitação das deduções (como com saúde, educação e dependentes). O governo também pretende trabalhar pelo retorno da tributação sobre lucros e dividendos, extinta em 1996. A proposta também é defendida por Lucena, em seu PL3783/2019.
Tratamento desigual para iguais
Lucena destaca, ainda, que as alíquotas incidem muito sobre os trabalhadores, as empresas e o consumo, e pouco sobre a renda. “As alíquotas progressivas do IR incidem basicamente sobre a renda do trabalho assalariado, aposentadorias e aluguéis. Tratamos de formas diferentes contribuintes que estão no mesmo patamar, e a maior parte da renda continua concentrada no topo da pirâmide. Isso fere o princípio da igualdade do IR. Infelizmente, o sistema tributário atual é muito mais generoso com o capital do que é com o trabalho e o consumo”, diz.
O parlamentar propõe que a Tabela progressiva Mensal do IR seja definida conforme abaixo:
Base de Cálculo(R$) | Alíquota(%) | Parcela a Deduzir do IR(R$) |
Até 5.200,00 | – | – |
De 5.200,00 até | 7,5 | 234,00 |
De 5.200,01 até 7.280,00 | 10 | 364,00 |
De 7.280,01 até 10.400,00 | 15 | 728,00 |
De 10.400,01 até 20.800,00 | 20 | 1.248,00 |
De 20.800,01 até 31.200,00 | 25 | 2.288,00 |
De 31.200,01 até 83.200,00 | 30 | 3.848,00 |
De 83.200,01 até 249.600,00 | 35 | 8.008,00 |
Acima de 249.600,01 | 40 | 20.488,00 |
“A nova tabela progressiva mensal é mais justa do ponto de vista econômico e social, isentando aqueles brasileiros que recebem até cinco salários mínimos. Hoje, esses cidadãos pagam alíquotas que variam de zero a 22,5%”, explica o deputado.
Uma segunda classe de alíquota, de 15%, incidirá sobre aqueles com renda mensal de R$ 5.200,00 até R$ 10.400,00. Hoje todos esses pagam uma alíquota de 27,5%. A terceira alíquota, de 25% incidirá na faixa mensal de salários que vai de R$ 10.400,00 até 31.200,00, que também pagam hoje uma alíquota de 27,5%.
Daí em diante, o PL insere mais três alíquotas, de 30, 35 e 40%, destinadas às faixas mais altas de renda.
“É importante que a população tenha consciência de como funciona nosso sistema tributário, que o cidadão e contribuinte acompanhe e participe desse debate. Não estou propondo criação de novos impostos, e nem criando dificuldades, mas precisamos corrigir distorções, de forma que o sistema se torne mais justo, mais igualitário, que deixe de penalizar os mais pobres e passe também a cobrar dos mais ricos, na proporção de sua renda”, finaliza Lucena.
Foto: Robert Alves