Deputado repudia decisão do STF a favor da descriminação do aborto de fetos anencéfalos

Sr. Presidente, Sras. Deputadas e Srs. Deputados, a vida perdeu uma importante batalha nesta última semana, no Supremo Tribunal Federal. O Supremo Tribunal Federal, com o largo placar de 8 votos a favor e 2 votos contrários, decidiu por descriminalizar o aborto de anencéfalos em nosso País.
Essa decisão fere normas jurídicas e constitucionais de proteção à vida, joga por terra, Deputado Amauri Teixeira, o Tratado de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário, e avilta frontalmente este Parlamento na medida em que o Poder Judiciário transcende suas competências e passa a legislar em flagrante menosprezo e até mesmo, eu diria, desprezo às atribuições desta Casa.
Confesso a V.Exas. que estou de luto e envergonhado ao assumir a tribuna nesta oportunidade.
Na última semana, tive oportunidade de relatar a V.Exas. uma das experiências mais ricas de toda a minha vida: o encontro com três das pessoas mais especiais que conheci ao longo da minha história. Refiro-me à pequenina criança de dois anos e meio de idade chamada Vitória e aos seus pais, Carlos e Joana – uma linda família, uma especial família da cidade de São Paulo, no meu Estado.
Essa criança, Sr. Presidente, inexplicavelmente, vive sem cérebro, feliz, ao lado de seus pais. E ela – também inexplicavelmente – os reconhece. Eu não sei explicar isso. A ciência não sabe explicar, mas ela os reconhece. Ela é uma linda menina, uma linda criança.
Vitória de Cristo – este é o seu nome -, por si só, sem dizer uma só palavra, é um discurso eloquente em defesa da vida. Ela sensibilizou não somente a mim, mas a todos os que comigo estavam nesse encontro, no corredor das Comissões, aqui na Câmara dos Deputados.
No entanto, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, esse discurso eloquente e poderoso não foi suficiente para sensibilizar os ilustres, os insignes Ministros da Suprema Corte. A cada voto declarado, uma surpresa desagradável, um espanto, um choque se abatia sobre os perplexos defensores da vida.
E quero fazer um destaque ao voto do Relator, ao voto do Ministro Marco Aurélio Mello. Quero deixar claro o meu respeito por S.Exa. Trata-se, na minha opinião, de uma das mentes mais ilustres e brilhantes do nosso País. Sua coerência, capacidade e lucidez são extraordinárias. E, muitas vezes, tenho vindo a esta tribuna aplaudir os seus posicionamentos. Ouvi-lo é sempre enriquecer-se, mas, nesse julgamento em especial, o ilustre Ministro Marco Aurélio equivocou-se.
O Ministro abriu os seus argumentos falando da presença do crucifixo na sala, no plenário da Corte, e nas instituições públicas.
Falou da laicidade do Estado, da militância dos religiosos em temas que envolvem a defesa da vida. E qual é, Sr. Presidente, a conexão? Qual é a relação entre o objeto que estava em discussão naquela Corte na oportunidade e esses temas, esses tópicos em que tocou o Ministro Marco Aurélio?
Os Ministros da Suprema Corte, parece-me, tentaram carimbar os argumentos daqueles que se apresentaram contrários aos seus entendimentos à condição de argumentos religiosos.
Questionou-se a participação ou a tentativa da CNBB de participar do debate. Descredenciou-se a CNBB para o debate, como se uma instituição tão sólida como a CNBB, que representa um segmento religioso, não tivesse capacidade, não tivesse condições de participar do debate desse tema numa condição jurídica, numa condição legal, como se fosse tratar do assunto apenas sob a perspectiva religiosa.
Em alguns momentos, Sr. Presidente, parece mesmo que ser religioso neste País é colocar-se num subpensamento, num subentendimento. Quantas vezes o fato de pertencer a uma bancada evangélica ou de fazer parte de uma bancada católica parece carimbar a condição dessa pessoa, desse Parlamentar, nas defesas que faz da vida e da família, como se fosse, antes mesmo de apresentar os seus argumentos, um fundamentalista, um retrógrado, um fanático?
Quero fazer referência, por exemplo, à presença do crucifixo neste plenário. Para mim, não se trata apenas do símbolo de uma fé religiosa. Ele retrata uma mensagem, uma mensagem poderosa que parece incomodar, que parece constranger, porque a mensagem que esse símbolo revela é a do Homem mais injustiçado que já viveu na face da Terra.
Um bom filho, um bom irmão, um bom cidadão, alguém cumpridor dos seus deveres, que pagava os impostos e fazia o bem às pessoas, mas foi acusado injustamente, caluniado e julgado de maneira fraudulenta. Condenado sumariamente, em seguida, sofreu a pena capital.
Temos, portanto, o maior injustiçado de todos os tempos. E, quando Ele está presente aqui ou no plenário da Suprema Corte, representado por esse símbolo, ali está a mensagem, faz um apelo às nossas consciências para que injustiças não sejam cometidas – injustiças como a que o STF cometeu com os familiares das vítimas de Cesare Battisti, quando permitiu que ele se escondesse sob as togas dos Ministros e não fosse extraditado para a Itália, onde havia sido condenado por ter cometido crimes. Nós dissemos ao mundo que ele era bem-vindo no Brasil e ainda lhe demos cidadania.
O Brasil, Sr. Presidente, é um Estado laico, mas não é um Estado ateu, não é um Estado laicista. O preâmbulo da nossa Constituição invoca a proteção de Deus. Neste plenário, sobre a mesa, temos a Bíblia Sagrada, que aí não está apenas como um livro religioso; ela contém, por exemplo, o Decálogo, que nos traz os fundamentos da legislação.
Qual dos temas tratados pelo Decálogo poderíamos extrair para que a sociedade seja melhor, mais justa, mais humana, mais digna?
O que vimos, pelo contrário, no esforço para que esse debate fosse reduzido à questão religiosa, é uma insanidade, não faz absolutamente nenhum sentido. O debate não era religioso, porque o que se estava debatendo era questão de dignidade da vida humana, assegurada pela nossa Constituição e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. E vimos a vida perder essa significativa e importante batalha.
Neste momento, Sr. Presidente, quando decidimos permitir o aborto dos anencéfalos, decidimos eliminar os indesejáveis. A sociedade brasileira decidiu? Sim, decidiu por meio dos votos dos Ministros do STF, que não receberam nenhum voto, ao contrário dos Parlamentares que integram o Poder Legislativo. A sociedade brasileira agora decide eliminar os indesejáveis.
Hoje, Sr. Presidente, estamos permitindo que sejam eliminados os indesejáveis anencéfalos; daqui a pouco, vamos permitir que sejam eliminados os indesejáveis que têm síndrome de Down; mais adiante, por um exame morfológico, vai-se detectar que um feto em formação tem um defeito no pezinho, e vamos eliminar os indesejáveis com um defeito no pezinho?
Chegará o momento, Sr. Presidente, em que vamos eliminar aqueles que nasceram doentes ou com defeitos físicos, aqueles que estiverem fora dos padrões de beleza, que acharmos que não são bonitos.
Estamos descartando, eliminando os indesejáveis, como já o fazem algumas etnias indígenas no Brasil. Trezentas crianças indígenas são eliminadas a cada ano em nosso País, porque eram gêmeas, porque nasceram doentes, porque nasceram com defeito físico ou até porque nasceram de mães solteiras.
Sras. e Srs. Parlamentares, quero chamar a atenção de V.Exas. para o risco que estamos enfrentando, para o que está à nossa frente. Existem alternativas que precisam ser pensadas por este Parlamento.
Primeiro, precisamos iniciar um programa de prevenção, o que ainda não foi feito nesta Casa em razão do interesse de grupos econômicos poderosos. Nesse sentido, vamos encaminhar amanhã, por meio da Mesa da Casa, pedido ao Executivo para que as meninas recebam, ainda crianças, dosagens de ácido fólico no alimento que consomem. Isso reduzirá drasticamente o risco de nascerem anencéfalos em nosso País.
Sras. e Srs. Deputados, existe uma alternativa ao aborto de anencéfalos: permitir à mãe, quando o exame morfológico detectar que ela está gestando uma criança anencéfala, antecipar o parto, e a criança ser colocada numa incubadora, para que a vida possa completar o seu ciclo natural.
Precisamos assumir nesta Casa o compromisso de nos levantar em defesa da vida, o compromisso de defender a dignidade da vida humana, porque, quando abrimos mão desse princípio fundamental, estamos aos poucos negociando e abrindo mão de outros valores e princípios que nos revelam a disposição que temos, como sociedade, de cada vez mais nos desumanizarmos.
Sr. Presidente, peço a V.Exa. a compreensão de me conceder mais 2 minutos para eu concluir minha linha de raciocínio e finalizar meus argumentos.
Na última semana, desta tribuna, lembrei a V.Exas. um episódio que me comoveu, bem como a milhões de pessoas em todo o mundo. O Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, durante missa na semana da Páscoa, fez um pedido emocionado a Jesus Cristo. Ele pediu a Jesus Cristo que lhe concedesse mais anos de vida, porque ainda não havia conseguido fazer pelo povo venezuelano tudo o que pretende.
Comovi-me com a cena porque sei exatamente o que é enfrentar o adversário terrível que o Presidente Hugo Chávez enfrenta. Eu já tive um câncer. Sei, portanto, o drama que o diagnóstico do câncer representa. É uma batalha enfrentada não apenas por medicamentos ou tratamentos: é uma batalha travada interiormente, mentalmente, psicologicamente e espiritualmente, a cada dia.
Naquele momento, Sr. Presidente, pensei: se tivéssemos condições de ouvir essas crianças, esses fetos anencéfalos, o que eles diriam? Quais seriam os apelos que eles fariam às nossas consciências?
Desejo ao Presidente Hugo Chávez vida longa, desejo que se restabeleça, que tenha força e consiga superar essa adversidade e as dificuldades e fique bem, assim como desejo o bem ao nosso país irmão, a Venezuela.
Mas desejo fazer um apelo veemente a V.Exas. no sentido de que esta Casa tenha como principal razão do seu trabalho, da sua existência e da sua constituição a luta em defesa da vida. A vida é a nossa base, é o fundamento, é o motivo, é a razão pela qual todos nós, todas as senhoras e todos os senhores, fomos legitimados pelo povo para aqui a defendermos.
Finalizo, Sr. Presidente, agradecendo a V.Exa. a generosa concessão.
Deputada Erika Kokay, demais colegas, que Deus tenha misericórdia de nós, que Ele tenha misericórdia do Brasil, que Ele tenha misericórdia das nossas crianças!

Que Deus abençoe o Brasil!
Muito obrigado.

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